Andrew Solomon em seu livro “”O demônio do meio-dia : uma anatomia da depressão”, 2014, traz importantes reflexões sobre a depressão. Trago para nossa conversa sobre depressão a reflexão de alguns trechos de seu livro. Especificamente recortei fragmentos que nos remete a pensarmos a depressão como um processo, ou seja, como algo que vai se formando, acontecendo, tem sua dinâmica, singular e temporal.
Vamos à leitura dos trechos do livro.
Temporalidade (TEMPO). Transitoriedade. A depressão existe no tempo. um paciente pode dizer que passou certos meses sofrendo de uma depressão severa, mas isso é um modo de impor uma medida ao imensurável. Tudo que se pode realmente dizer é que a pessoa passou por uma depressão severa e que ela está ou não a vivenciando em determinado momento presente.
DEPRESSÃO LEVE: é essa aguda consciência da transitoriedade e da limitação que constitui a depressão leve.
A depressão começa do insípido, nubla os dias com uma cor entediante, enfraquece ações cotidianas até que suas formas claras são obscurecidas pelo esforço que exigem, deixando-nos cansados, entediados e obcecados com nós mesmos (DEPRESSÃO COMO PROCESSO).
Na maturidade do novo milênio, espero que salvemos as florestas tropicais deste planeta, a camada de ozônio, os rios e correntes, os oceanos, e salvaremos também, espero, as mentes e corações das pessoas que vivem aqui. então controlaremos nosso medo crescente dos demônios do meio-dia — nossa ansiedade e depressão.
A depressão existe agora tanto como um fenômeno pessoal quanto social. Para tratar a depressão é preciso entender a experiência de um colapso mental, o modo de ação dos medicamentos e as formas mais comuns de terapia falada (psicanalítica, interpessoal e cognitiva). A experiência é uma boa professora, e os tratamentos correntes foram postos em prática e testados; mas muitos outros tratamentos, da erva-de-são-joão à psicocirurgia, oferecem uma promessa razoável — embora aqui haja mais charlatanismo do que em qualquer outra área da medicina. Um tratamento inteligente requer um exame atento de populações específicas: a depressão tem variações significativas entre crianças, idosos e cada um dos gêneros. Os dependentes químicos formam uma grande subcategoria própria. O suicídio, em suas muitas formas, é uma complicação da depressão. É fundamental entender como a depressão pode ser fatal.
“Receba bem esta dor”, escreveu ovídio certa vez, “pois algum dia ela lhe será útil.” É possível (embora improvável, nos tempos presentes) que, através da manipulação química, possamos localizar, controlar e eliminar o circuito de sofrimento do cérebro. Espero que nunca façamos isso, já que removê-lo significaria aplainar nossas experiências: prejudicar uma complexidade que é muito mais valiosa do que o caráter doloroso de suas partes. Se eu pudesse ver o mundo em nove dimensões, pagaria um alto preço para fazê-lo. Preferiria viver para sempre no nevoeiro do sofrimento a desistir da capacidade de sentir dor. Mas a dor não é depressão aguda; amamos e somos amados mesmo sofrendo de uma grande dor e estamos vivos quando a experimentamos. É o caráter de morto-vivo provocado pela depressão que venho tentando eliminar de minha vida; é como artilharia para essa extinção que escrevo este livro.
Referência bibliográfica: Solomon, Andrew o demônio do meio-dia : uma anatomia da depressão / Andrew Solomon ; tradução myriam Campello. — 2a ed. — São paulo: Companhia das letras, 2014.